A Tia, conta-se por aí, era uma senhora casta e devota, dedicada ao seu irmão mais velho; este escolheu o sacerdócio como mode de vida, seja pela crise de fé que se viviam naqueles tempos e que ele desejava reverter, ou seja porque tinha mais uns oito irmãos e a vida de padre o poderia livrar de alguns encargos pesados relacionados com a vida no campo.
Viviam juntos, tinham uma criança a seu cargo que, durante longos anos, o meu pai pensou ser filha deles.
Senhora séria, facilmente confundida com uma daquelas actrizes dos anos 30 ou 40, de voz esganiçada daqueles musicais filmes portugueses, a Tia surpreendeu-nos.
No idos anos 80, guardava ela a página de um jornal. Ainda não está quebradiça. Encontrei-o dentro de um pequeno baú de madeira, com imagens orientais talhadas. Leia-se "imagens que fazem lembrar qualquer coisa como a China ou o Japão e que os ocidentais incultos não conseguem distiguir". Até o trinco é semelhante à caixinha que eu possuo e que está cheia de guias dos museus de Bruxelas.
E o cheiro das caixas é igual. Das análises clínicas aos papeluchos da segurança social, incluindo o tal jornal e uma dentadura, tudo cheira a guias de museus. Sei-o, cheirei todas as coisas uma por uma. Até duas Nossas Senhoras de Fátima que pareciam ter brilhado no escuro... há muito tempo.